terça-feira, 29 de setembro de 2009

disco: MARIA GADÚ, Maria Gadú


Eu me deparei com esse disco e, desde então, não paro de descobrir qualidades nele.

Maria Gadú já é um nome conhecido, com música em trilha de novela e tudo o mais. Só que eu não ando muito no dial dos hits, então demorei mais para saber dela. E foi assim, uma coincidência providencial.


Num momento em que muitas moças acreditam piamente que são ótimas intérpretes e compositoras exemplares, Maria Gadú chega sendo e não apenas acreditando ser. A voz peculiar, capaz de nos acompanhar pela graça e pelo delírio de sua música, e o violão afinado com a poesia das letras, carregam uma irreverência necessária para conquistar ouvintes que querem mais, muito mais que sucessos fabricados.

No auge dos seus 22 anos de idade, Maria Gadú promete e, ainda bem, tem tudo para cumprir essa promessa.

sábado, 26 de setembro de 2009

filme: LA BELLE VERTE, Coline Serreau

Sabe quem eu gostaria de conhecer? O presidente da república, meus artistas favoritos? Não. Com certeza, meu bisavô, de quem todo mundo fala entusiasticamente na família, mas Pai Quinco já faleceu. Eu gostaria de conhecer uma dessas pessoas que fazem a tradução do título dos filmes. Uma dessas pessoas que me obriga a colocar o título original na chamada desta postagem porque não tenho coragem de usar o título brasileiro. Afinal, o que você pensaria de um filme com o título "Turista Espacial"? Possivelmente, algum filme de ficção científica barata. Não, é melhor que você — que talvez nem saiba francês — não tenha ideia do que o título quer dizer. A ignorância é melhor do que uma compreensão errada.

A Bela Verde é um título misterioso, porque não se fala nada sobre isso no filme. Se fosse A Bela Azul, suporíamos que se trata da Terra — e talvez se trate, porque, afinal, a Terra não deve ser azul pra todo mundo. A protagonista é Mila, uma habitante de outro planeta que deseja conhecer o planeta de origem de seus ancestrais: a Terra. Não, nada de máquinas e aparatos tecnológicos. A viagem é feita numa bolha impulsionada pelos pensamentos dos habitantes desse evoluído planeta — embora se pareça mais com um bando de hippies.

Aliás, há que se deixar de lado a razão pra aproveitar esse filme. O choque cultural que Mila enfrenta na Terra — automóveis, consumo de carne, ar poluído, raiva etc. — gera uma série de situações hilárias, por vezes graciosas, e quase sempre profundamente questionadoras da nossa maneira de enxergar o mundo e nossa vida.

Por exemplo, a deliciosa cena em que Mila pergunta a uma terráquea sobre o conteúdo de sua bolsa. Quer saber por que a mulher usa batom. A mulher diz que para ficar mais bonita, atraente, para agradar as pessoas, para ser amada por elas. Depois Mila pergunta sobre um álbum de fotografias, e a mulher lhe mostra o marido e os filhos. "Ah", diz Mila, "as pessoas que você ama". A mulher confirma. E Mila arremata: "E eles não precisaram usar batom?"



O filme é dirigido e estrelado por Coline Serreau. Como se não bastasse, ela ainda fez a trilha sonora. Um filme delicioso de assistir.

A Belle Verte me fez lembrar com saudades minha querida Andréa, que me introduziu à Antropologia e às diferenças culturais. Déa gostaria de ter conhecido esse filme. Talvez você também goste de conhecê-lo. Tem uma versão, embora numa resolução não muito boa, no Youtube. Desejo boa sorte se tentar localizá-lo numa locadora, o filme não é nada comercial.

Ah, um aviso: cuidado pra não ser desconectado. Do Youtube? Da internet? Não. Da matrix? Talvez. Assista ao filme e você vai entender.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

livro: OFICINA DE ESCRITORES, Stephen Koch

Manuais são armadilhas. Atraentes, mas fatais. Atraentes porque prometem acesso rápido e fácil a algo que parece difícil. Fatais porque decepcionam: é preciso mais do que um manual para se fazer qualquer coisa. Quando se trata de alguma atividade criativa, então, a atração e o perigo são ainda maiores, afinal quem acreditaria num manual de escrita, por exemplo? Os estilos e as formas de expressão na arte são tão variados que para cada "faça isso" existe um igualmente verdadeiro "faça aquilo", embora isso e aquilo possam, com alguma frequência, ser opostos.

Pois bem, Oficina de Escritores, do Stephen Kock, consegue escapar da armadilha. E o faz apresentando pontos de vista conflitantes sobre cada tópico. Embora o autor defenda seu próprio ponto de vista, ele sempre deixa a porta aberta para "exceções" que podem ser o caso do leitor candidato a escritor.

O livro inicia assim:

"Só há um jeito de começar: é começar agora. Comece, se preferir, assim que terminar de ler este parágrafo, ou, em todo caso, antes de concluir a leitura deste livro."

Esse simples início serviu como uma espécie de abracadabra pra mim. Ao terminar de ler o primeiro capítulo, eu, que até então tinha escrito apenas histórias curtas, comecei a escrever uma história que hoje, terminada a leitura de Oficina de Escritores, já passou da página 40. O livro de Koch, sem dúvida, tem um papel importante nisso.

As informações que encontrei nele estão sendo valiosas para que eu me desenvolva como um escritor e tenho certeza de que, mantendo-o à cabeceira, terei como concluir uma novela, talvez até mesmo um romance.

Outra virtude do livro é que há muitas, mas muitas mesmo, citações de escritores sobre o ato de escrever. Essas citações foram recolhidas em entrevistas e biografias desses autores e dão um toque todo especial ao livro, fazendo com que a gente se sinta mais próximo do mundo da literatura, como se já fizéssemos parte do clube de escritores que divide com a gente suas dicas.

Quantas vezes alguém pode dizer, nessa vida, que aprendeu com prazer? Poucas, bem poucas. Para mim, a leitura deste livro foi uma delas.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

disco: TEN SUMMONER'S TALES, Sting

Sting é um grande instrumentista, inspirado letrista, um músico de ótimas qualidades. Um dos discos dele que mais gosto foi lançado em 1993. Apesar do tempo que separa o lançamento do agora, este é um disco atual.

Ten Summoner’s Tales traz uma série de músicas belíssimas, com arranjos impecáveis. Também a riqueza rítmica me seduziu, não só por ser fã de carteirinha do baterista que participou deste projeto, Vinnie Colaiuta, mas também pela arquitetura musical idealizada por Sting.

A primeira vez que ouvi as canções desse trabalho, não foi em CD. O DVD Ten Summoner’s Tales pode trazer o mesmo material que o CD, mas certo é ter os dois. Filmado na casa de Sting, Lake House, em Wiltshire, Inglaterra, o DVD traz versões ao vivo, além de momentos interessantíssimos entre os músicos.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

filme: EU, MEU IRMÃO E NOSSA NAMORADA, Peter Hedges

Eu gosto de filminhos. Não, não falo de curtametragens. Filminho é aquele filme que não tem diretor famoso, não é baseado em nenhuma obra-prima da literatura universal, não retrata nenhum grande evento histórico, não tem incríveis efeitos especiais nem apresenta inovações técnicas de uso de câmera, enquadramento etc. Filminho é aquele filme que conta uma boa história e pronto. Vai direto ao ponto, emociona. Adoro filminhos.

Acabei de ver um filminho. Que a distribuidora brasileira parece que queria transformar num "filminho" (em sentido pejorativo) ao fazer a tradução do título: em vez de "Dan na vida real" ("Dan in Real Life") ou simplesmente "Na vida real", ou ainda mais simplesmente "Na real", resolveram colocar isso aí: "Eu, meu irmão e nossa namorada". Esse é tipo do título que jamais me faria a ver um filme, tanto que só soube do título depois, porque encontrei o filme na lista dos 250 melhores do IMDB (Internet Movie Database), o site para onde vou quando quero saber qualquer coisa sobre um filme qualquer, filminhos e filmões. O site é em inglês — infelizmente para alguns.

A ideia do filme chega a ser simplória: um cara, viúvo com três filhas, se apaixona pela namorada do irmão. O detalhe: antes de saber que ela é a namorada do irmão, e a caminho de um final de semana em que o irmão apresentaria a nova namorada para toda a família. Agora complicou, quer dizer, melhorou. É a vez do viúvo, que escreve colunas moralistas a la Içami Tiba, provar da tal vida real: atraído por alguém por quem não deveria estar atraído.

As situações são maravilhosas: às vezes delicadas, às vezes hilárias; sempre comoventes. Um dos destaques é a trilha sonora. Músicas ritmadas, muito gostosas de ouvir, e que dão vontade de dançar. Em determinado momento, a trilha sonora se mistura com a história, quando o viúvo está esperando uma conhecida que tinha visto pela última vez na adolescência, e que era conhecida como "cara de porco". Os irmãos de Dan inventam a canção da Cara de Porco que — surpresa! — quando chega à casa, todos descobrem tratar-se de uma mulher lindíssima. Nada comparada, entretanto, à bela Juliette Binoche, namorada do irmão, então Dan ainda tem que passar por maus pedaços.

Bom, é isso. Contei demais. Mas uma outra característica dos filminhos é que não importa você saber da história, o filme continua bom. Filminhos são bons de ver vezes sem conta, mesmo a gente já sabendo tudo que vai acontecer, tintim por tintim.



Então vão lá. Saboreiem o trailer e depois vejam o filme. E passem adiante, porque filminho também não tem grandes orçamentos de propaganda: depende do boca-a-boca.

filme: ACROSS THE UNIVERSE, Julie Taymor


Eu não sou conhecedora de The Beatles como alguns que eu conheço. Na verdade, comecei a me aprofundar na obra deles, depois de ouvir todos os discos, ano passado, e compreender a genialidade, os belíssimos arranjos e as instigantes letras que seduzem milhões e há décadas.

Permiti-me seduzir... Finalmente, alguns amigos alegaram. Finalmente, posso alegar.

Depois dos discos, veio o conhecimento sobre as mais interessantes versões de hits da banda. Incrível como os mocinhos de Liverpool criaram canções capazes de permanecer tão atuais. E foi aí que cheguei a um fantástico musical: Across The Universe.



Lançado em 2007, este filme é uma obra-prima, mesmo se considerado pelo meu parco conhecimento sobre The Beatles. Se eu não conhecesse nenhuma canção apresentada no filme, certamente me apaixonaria por ele assim mesmo, e no ato!

A história de “Across The Universe” é muito bem costurada às cenas musicais, misturando-se o enredo de forma tão intensa que as músicas parecem surgir, como se fossem a trilha sonora da trama. Não sentimos aquele quê de “agora é hora da música” que nos desconecta da história e muitas vezes nos aborrece em fórmulas prontas de musicais não tão bem produzidos.



Há momentos especiais, como as participações de Joe Cocker em Come Together e de Bono Vox em I am the walrus. Sem contar as presenças marcantes de Dana Fuchs e Martin Luther.



Com um elenco de primeira, atores e intérpretes, entre eles Evan Rachel Wood interpretando Lucy e Jim Sturgess como Jude, e a visão moderna da diretora Julie Taymor, “Across The Universe” certamente nos oferece uma viagem fantástica pelo tão fantástico quanto mundo de John, Paul, George e Ringo.


quarta-feira, 16 de setembro de 2009

disco: ALEGRIA GIRAR, Validuaté


Este é o segundo cd da banda piauiense Validuaté. Prometi o cd como presente a um caro amigo cearense que passa uma temporada em Brasília. Promessa comprida e ainda não cumprida, mas de todo modo o CD chegou primeiro neste blog, como minha participação inicial.


A capa é linda e não é tudo. Se a menina black joga ou segura a isca ou a linha da pipa (pandorga, papagaio) na capa, se as janelas estão todas ou quase todas abertas, na contra capa há um lindo peixe pretensamente francês (sabe-se depois) em sua saga, e um guardachuva vermelho. Se as nuvens habitam as paredes,
o céu está no chão...



“Caminhos não há,
mas os pés na grama os inventarão.
Aqui se inicia uma viagem clara rumo à encantação”.

Promessa lida pelo bardo Ferreira Gullar.

Promessa cumprida pela banda piauiense, universitários com origem mezzo Teresina, mezzo União (cidade próxima à capital).





São 13 canções, letras originais de compositores múltiplos, sons piauienses e universais. Tambores, pop-rock, brega trash-romântico, cavaquinhos e sambas indies, canto gregoriano (dispensável), baladas de amor e desamor, temas líricos e épicos para corações e mentes, numa mistura elegante, inteligente e original.
E piauiense porque não.

O trabalho conta com participações especiais: a vinheta com o Ferreira Gullar na abertura dos trabalhos, a locução do Isaac Bardavid com narração de excertos trovejantes na “Lenda do Peixe Francês” — uma das melhores letras — e um texto cinemascópico para o próximo Anima Mundi, de Thiago e (poesia, cavaquinho, pandeiro e vocais). Vejam se não daria um ótimo enredo de desenho animado.


Lirinha do Cordel do Fogo Encantado pontua a quilométrica e engenhosa “Hermeto e o Gullar” (a propósito...alguém já viu a orelha da Maria Bethânia?). Da Bahia, Zéu Brito, baiano com incursões em diversas artes, e a parceria em ‘Bruta como Antigamente”, com pitadas sadomasoquistas hilárias. Márcio Greyck não canta no CD, mas de sua lavra os meninos transmutam “Eu preciso de você” — em leitura inspirada.

E as composições da banda, os vocais do José Quaresma, os instrumentos e arranjos que garantem uma sonoridade parceira da qualidade acima da média das letras.


Há grandes versos:

de “Cortesia”: soturno vão há em meu coração...sem me tocar sou luz em refração...a soluçar um riso indolor...se fico só em meio a multidão, sem viajar me pego em União... e lá sei que minh’alma abre em flor;


em outras letras há alguns achados de pretéritos mais que perfeitos
quisera eu tamanha inspiração...

Lançado no final de julho em Teresina, no Teatro 04 de Setembro, com casa lotada em uma quinta-feira, numa noite de chuva torrencial,

a ‘chuva dos cajus’,
trouxe a floração de uma banda em estado de graça.

Se os pátios estavam partidos em festa, título do muitíssimo bem recebido primeiro cd da banda,









a alegria girar foi a marca, a inspiração, a respiração e a transpiração deste novo momento.

“Já é tempo de sair do lugar, já é tempo da tristeza acabar. Já é tempo da alegria girar”.

Ouçam trechos das músicas no site da banda.


Até a próxima!

terça-feira, 15 de setembro de 2009

filme: HÁ TANTO TEMPO QUE TE AMO, Philippe Claudel

"Viver é afinar o instrumento: de dentro pra fora, de fora pra dentro", diz a canção.

Quando quero afinar minha vida de fora pra dentro, assisto a filmes. Mas bom mesmo é quando penso que já estou afinado e vem um filme, do nada, pra me afinar exatamente naquilo que eu estava precisando mesmo que eu ainda não tivesse percebido isso. Aconteceu comigo semana passada, quando entrei numa sala pra ver "Há tanto tempo que te amo", de Philippe Claudel.

É estranho falar desse filme porque, ao vê-lo, desejei não ter lido nada, absolutamente nada sobre ele antes de assisti-lo. Eu li apenas a sinopse, e talvez meu impacto tivesse sido ainda maior se não tivesse lido sequer a sinopse. Então eu simplesmente diria: "Vá vê-lo, sem informação prévia ou expectativa". Mas não funcionaria porque você já recebeu esse pouco de informação que estou dando e eu, de certa forma, já criei uma expectativa.

Então posso dizer que é um daqueles filmes em que os personagens são tão incomumente comuns e tão distanciadamente próximos que você tem vontade de viver com eles por alguns dias, participar de suas vidas, ver o que acontece depois que o filme acaba.

Vou contar, sem contar. Serei evasivo...

Tudo começa com uma irmã mais velha que é recebida na casa de uma irmã mais nova após uma longa ausência. Essa irmã mais velha, enquanto tenta arranjar trabalho na nova cidade, altera a rotina da casa de sua irmã mais nova, tendo uma relação conflituosa com seu marido e suas duas filhas. O conflito está cheio de medo e, à medida que o medo vai sendo vencido pela comunicação, começa a se estabelecer o amor naquela casa. Pronto, é isso. Mais não digo. Tem que ser visto. Com poucas informações e sem expectativa, insisto.

Se você não entende nada de francês, nenhuma palavra sequer, veja o trailer abaixo e comece a se acostumar com os rostos antes de vê-los na tela do cinema.




E bom filme!

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

filme: QUATRO MINUTOS, Chris Kraus

Hoje passarei na locadora. Quem sabe, depois de alguns pedidos, eles já tenham recebido o filme que desejo assistir novamente. Não... Ele não é nada fácil de digerir, porém tem aquela beleza bruta que toda dolência oferece. E a gente se apaixona justo por aqueles momentos em que as personagens principais se rendem ao afeto que nasce entre elas, apesar da relutância, das suas biografias desgrenhadas.

Assisti “Quatro Minutos” num canal de TV a cabo, há alguns meses. “Vier Minuten”, nome de batismo do dito, ele que é oriundo da Alemanha, fala sobre duas mulheres: uma jovem, brincado de cabra-cega com vida à beira do abismo, e uma já senhora, com a história de vida embrenhada nas rugas que enfeitam a sua feição dura.

Nada na vida dessas mulheres remete à leveza. O filme se passa, quase inteiro, dentro de uma prisão feminina, na qual Traude Krüger (Monica Bleibtreu) leciona piano e Jenny von Loeben (Hannah Herzsprung), um talento musical voraz, cumpre pena por assassinato.

É justamente a música que consegue nos lembrar da humanidade dessas pessoas envolvidas com seus crimes, suas carências, a autoria de vidas desamparadas. O piano na sala de concreto fria, à mercê da realidade; os dedos de Jenny dançando ora rasteiros ora lânguidos pelo piano, enfrentando a austeridade da professora. Em alguns momentos, torcemos para elas se dispam das suas reservas, das tolas proteções, e demonstrem um pouco que seja de carinho uma pela outra. Não que o carinho não exista.

Belíssimo filme, com duas atrizes fantásticas, e uma cena final que me deixou muito emocionada. Só gostaria de saber se é a própria Hannah Herzsprung quem toca o piano. As cenas dela ao piano são um misto de exuberância, raiva, ritmo e paixão.

livro: OS ARQUIVOS DE DEUS, Ruy Fabiano

Comecei a ler o livro no dia seguinte ao lançamento. Larguei no primeiro conto.

Um ano depois, com raiva de mim mesmo por comprar tantos livros e não ler, resolvi dar uma chance aos que estavam desprezados na estante. Então peguei novamente OS ARQUIVOS DE DEUS, do Ruy Fabiano. Não recomecei pelo primeiro conto, para não correr o risco de parar novamente. Fui direto ao segundo conto e, daí, não parei mais.

Não que tenha sido uma leitura fácil. Em alguns momentos, tem-se a mesma dificuldade que com Borges da primeira vez. Mas os contos são interessantes, embora tratem de um assunto que jamais pensaria dar um bom livro de contos: a espiritualidade. O que faz o livro interessante é a abrangência com que o Ruy Fabiano trata o tema, tanto do ponto de vista da forma quanto do conteúdo. Os contos variam de simples causos de assombração a verdadeiros tratados sobre a origem do universo. Seja sobre uma simples morte, seja sobre a pedra filosofal, o livro vai nos ganhando pelas histórias bem contadas: lançam o anzol logo no início e depois vão nos fisgando aos poucos; terminamos frequentemente presos no final de cada conto.

Eis o início de um dos contos, "O Encontro", só pra tentar fisgar vocês:

"Dizia-me Sebastião Baptista, saudoso poeta de cordel, em torno de quem gravita esta história, que no sertão o Diabo é vizinho de Deus. E ainda: 'É preciso cuidado para não bater na porta de Um e encontrar, por equívoco, o Outro'. O próprio Sebastião, como adiante veremos, viveu essa circunstância."

Boa leitura!